REFORMA NÃO ANDA E BRASIL É CAMPEÃO MUNDIAL DE BUROCRACIA TRABALHISTA

Dois anos depois da posse - e das promessas - de Lula, estudo nos EUA aponta o País como o de maior rigidez e excesso de leis no setor

RIO - Dois anos depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter assumido o governo prometendo modificar a fundo as leis trabalhistas e acabar com o excesso de regulamentação do setor, o Brasil foi apontado, num estudo das universidades americanas de Yale e Harvard, como o recordista mundial de regulação trabalhista. O trabalho é de 2003 e foi preparado por cinco economistas daquelas duas universidades americanas e do Banco Mundial. O País aparece, nas conclusões, como o que tem as leis trabalhistas mais pesadas e rígidas, em um grupo de 85 nações ricas, emergentes e pobres.

Os pesquisadores criaram um índice de leis do trabalho (quanto maior, mais regulamentação), no qual o Brasil atinge 2,40 - o maior nível entre todos os países analisados. Para elaborar os índices, eles computaram características e indicadores das relações trabalhistas em cada país, como nível de detalhamento das obrigações contratuais, flexibilidade de contratos e custo de demitir. O estudo chama-se A Regulação do Trabalho e seus autores são Juan Botero, Simeon Djankov, Rafael La Porta, Florencio Lopez-de-Silanes e Andrei Shliefer.

Entre os países desenvolvidos, os Estados Unidos têm índice de 0,92 e a Alemanha, de 1,57 (ver gráfico). Na América Latina, região conhecida pela rigidez da legislação trabalhista, o Brasil fica bem acima do Chile (1,57), Argentina (1,55) e Peru (1,67), e também mostra mais rigidez do que o México (2,01) e Argentina (1,55). No leste asiático, caracterizado pelo alto crescimento econômico e baixo nível de desemprego, o índice de leis de trabalho é, de forma geral, mais baixo. O índice da Malásia é de 0,87, de Cingapura, 0,85, Hong Kong, 0,76, e o da Coréia, 1,36.

Analisando estatisticamente uma base de dados com indicadores dos 85 países, os economistas concluem no estudo que, em média, 1 ponto a mais no índice de leis de trabalho aumenta a fatia da informalidade na economia em 6,7 pontos porcentuais, a fatia do subemprego em 13,74 pontos porcentuais, e o desemprego, em 3 pontos porcentuais.

No caso de jovens do sexo masculino, 1 ponto a mais no índice está relacionado a um aumento do desemprego de 6 pontos porcentuais. No de jovens mulheres, de 10 pontos.

RESISTÊNCIA

Estas conclusões coincidem com a pregação de alguns economistas brasileiros, como José Márcio Camargo, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio. Para ele, a excessiva rigidez das leis trabalhistas no Brasil contribui para o desemprego e a informalidade. "Um efeito importante é que as empresas têm enorme resistência a contratar, e empregam menos do que poderiam", afirma Camargo.

A tese da pesquisa americana e de Camargo é confirmada por Romualdo Queirós, sócio-gerente da Papelaria México Rio, no centro do Rio, com 18 funcionários. "Nós somos enxutos, não temos nenhuma gordura em termos de pessoal, porque o ônus quando se faz ma demissão é alto demais", diz Queirós. Ele cita a multa sobre o FGTS de 50% (40% para o empregado e 10% para o governo) como um dos muitos motivos para pensar duas vezes antes de contratar. Segundo o gerente, se as leis trabalhistas não fossem tão onerosas, a papelaria abriria mais duas vagas.

Além de uma oferta menor de empregos, a relutância das empresas também acaba estimulando a economia informal. A menos de um quarteirão da Papelaria México, a vendedora ambulante Elizia Souza Carvalho, de 39 anos, que estudou até a 1.ª série do ensino médio, conta que procurou um emprego formal durante muito tempo, mas acabou desistindo. "Ter carteira era melhor", diz a vendedora, referindo-se ao período em que trabalhou em um supermercado, antes do nascimento do seu filho.

O índice de leis de trabalho da pesquisa americana é composto de três subíndices. O primeiro refere-se à possibilidade de o empregador oferecer contratos alternativos ao padrão definido por lei. O segundo é o de condições de trabalho e contém informações sobre jornada, descanso semanal remunerado, pagamento de horas extras, licença maternidade, etc. O terceiro subíndice é o de segurança no emprego, relativo às regras e custos da demissão. Como no índice total, quanto maiores forem a rigidez e os custos em cada uma daquelas esferas da relação de trabalho, maiores são os subíndices.

NO TOPO

O Brasil atinge 0,86 no subíndice de contratos alternativos, só ficando abaixo do Panamá (0,87) entre os 85 países, cuja média é de 0,59. Em relação às condições de emprego, com média de 0,63, o subíndice brasileiro é de 0,69, o oitavo maior. Em termos de segurança no emprego, o subíndice do Brasil é o quinto maior, em 0,69, ante uma média de 0,35 para todo o grupo. Na soma dos três subíndices, o Brasil chega ao topo, com 2,40, comparado à média de 1,58 dos 85 países.

Camargo observa que, no Brasil, para que um contrato de trabalho seja legal, é preciso cumprir uma quantidade excessiva de cláusulas. "Trabalhadores e empresas não conseguem negociar contratos diferentes, e qualquer tentativa neste sentido acaba criando um contrato ilegal, que vai parar na Justiça quando a relação de trabalho termina."

Além do índice de leis de trabalho, a pesquisa dos cinco economistas criou dois outros indicadores. O primeiro é o índice de relações industriais, que mede a rigidez e o custo das regras para as negociações entre empresários e trabalhadores. O Brasil, com 1,86, tem o nono maior índice entres os 85 países, e está acima da média do grupo, de 1,25.

Outro índice é o de seguridade social, ligado especificamente aos custos previdenciários do contrato de trabalho.Nele, o Brasil, com 1,67, está quase na média dos 85 países, que é de 1,65. A seguridade social é o único dos três índices no qual os países ricos, com média de 2,18, mostram encargos bem mais pesados do que o dos emergentes (1,82) e dos pobres (1,38).

Fernando Dantas

O Estado de S.Paulo - 20.12.2004


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