E-MAIL: O EMPREGADOR PODE MONITORAR?

Folha de S.Paulo 17.06.2005 - JOÃO ORESTE DALAZEN

A tecnologia da internet, sobretudo da correspondência eletrônica, tem suscitado um elenco infindável de instigantes questões jurídicas. Uma delas consiste em saber se o empregador tem o direito de rastrear ou monitorar o e-mail do empregado e, em última análise, se é lícita a prova assim obtida para apuração de justa causa em processo judicial.

Impõe-se a distinção de duas situações básicas. No caso de e-mail particular ou pessoal do empregado, ninguém pode exercer controle de conteúdo, porquanto a Constituição Federal assegura a todo cidadão não apenas o direito à privacidade e à intimidade como também ao sigilo de correspondência, o que alcança qualquer forma de comunicação pessoal, ainda que virtual.

Outra situação, bem diversa, é aquela do chamado e-mail corporativo, em que o empregado utiliza-se de computador da empresa, de provedor da empresa e do próprio endereço eletrônico que lhe foi disponibilizado pela empresa para a utilização estritamente em serviço. O e-mail corporativo é como se fosse uma correspondência em papel timbrado da empresa.

Sabe-se, todavia, que alguns empregados, com relativa freqüência, abusam da utilização do e-mail corporativo de múltiplas formas bem conhecidas: envio a terceiros de fotos pornográficas ou divulgação de mensagens obscenas, racistas, difamatórias, reveladoras de segredo empresarial ou contendo vírus etc. Outras vezes o empregado, em terminal da empresa, vale-se da internet para baixar músicas e filmes. Enfim, consome tempo e recursos preciosos do empregador para tratar de assuntos não relacionados ao trabalho.

A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que é válida a prova exibida em juízo pelo empregador consistente no rastreio do e-mail corporativo e de seu provedor de acesso à internet visando apurar de quem era a responsabilidade pela divulgação de fotos pornográficas a partir de seus equipamentos e sistemas de informática. A prova foi considerada legal porque o e-mail corporativo tem natureza jurídica equivalente a uma ferramenta de trabalho. Logo, em princípio, a não ser que o empregador consinta, é de uso estritamente profissional.

Nessa perspectiva, antes de tudo, esse monitoramento da atividade do empregado traduz exercício do direito de propriedade do empregador sobre o computador, sobre o provedor e sobre o próprio correio eletrônico. Não há qualquer intimidade ou privacidade do empregado a ser preservada, na medida em que essa modalidade de e-mail não é colocada à disposição do empregado para fins particulares. Não se pode vislumbrar direito à privacidade na utilização de um sistema de comunicação virtual engendrado para o desempenho da atividade empresarial e de um ofício decorrente de contrato de emprego.

Diversos tribunais dos EUA, país célebre pelo respeito aos direitos e garantias individuais do cidadão, vêm consignando que o empregado não tem razoável expectativa de privacidade quanto à utilização do e-mail corporativo e do acesso à internet pelo sistema da empresa. No Reino Unido, país de igual tradição, o Parlamento aprovou lei, conhecida como RIP (Regulamentation of Investigatory Power), que autoriza os empregadores, desde 24/10/2000, a promover o monitoramento de e-mails e telefonemas de seus empregados.

O e-mail corporativo não pode ser equiparado à correspondência de natureza pessoal, de modo a merecer a tutela constitucional. É simples instrumento de trabalho que o empregador confia ao empregado para auxiliá-lo no desempenho de suas atividades laborais. Bem se compreende que assim seja visto, pois as mensagens eletrônicas trafegam pelo sistema operacional do empregador exclusivamente para fins corporativos. Portanto, não há como estender ao e-mail corporativo a inviolabilidade das correspondências postal e telefônica.

A senha pessoal de acesso para a caixa de correio eletrônico também não gera qualquer expectativa de privacidade em relação ao e-mail corporativo: dita senha é mecanismo de proteção do empregador, pois visa evitar que terceiros alheios à sua confiança acessem o conteúdo das mensagens profissionais.

Por fim, não se pode esquecer que a lei fixa a responsabilidade do empregador por quaisquer danos que seus empregados causem a terceiros. Tudo sopesado, estou convencido de que o controle sobre o e-mail corporativo não afronta a lei e a Constituição Federal, sobretudo quando exercido de forma moderada, generalizada e impessoal. Constitui providência essencial à proteção das informações (não raro, sigilosas) que circulam dentro da empresa, além de evitar atividades ilegais e abusivas, suscetíveis de provocar dano à imagem da empresa e significativos prejuízos.

João Oreste Dalazen, 52, professor da UnB (Universidade de Brasília), é ministro do Tribunal Superior do Trabalho. Foi o relator do processo em que se considerou legal o rastreamento de e-mail do empregado pelo empregador.


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